Fui Discriminado Por Ser Crente

Pastor Clodoaldo Malafaia.

Labuto num grande shopping na cidade de São Paulo, onde sou um respeitado agente de segurança, mui conhecido e admirado. Enquanto os outros funcionários voltam de ônibus ou a pé, vou com a minha Honda para todo lado - veículo que estilizei com chamas verdes e figuras planetárias (atraio a atenção dos olhares mais curiosos, fascinados por meu comportamento bad boy). Mas isto é só fachada, pois no fundo sou boa gente, vinzimista e obreiro da digníssima Igreja do Primeiro Impacto.

Há alguns meses venho estando enamorado. Conheci uma atendente de uma loja de brincos chamada Raissuele, uma tetéia deveras formosa, que seduzida por meus xavecos e boa lábia aceitou sair comigo. Depois de certo tempo de relacionamento, decidimos firmar um compromisso mais sério. Estávamos tão firmes que até fiz uma tatuagem "I Love Raissu" em meu bíceps direito (economizei uma grana por não fazer as 3 últimas letras).

Tudo corria bem, até que ela me propos conhecer sua família. Só aí eu descobri que Raissuele era espírita kardecista da umbanda reco-reco (um desses segmentos macabros da maçonaria). Embora fosse não-praticante, seus pais eram fervorosos, e até mesmo possuíam uma estátua de gesso do Chico Chavier sobre a geladeira, tal como os católicos fazem. Malandro que sou, sabia que por ser evangélico, acabaria sendo discriminado, só ainda não estava certo quando e como.

A mãe de Raissuele na ocasião fez largato e batatas assadas, mais espaguete e almôndegas, quitutes realmente apetitosos. Com meu apetite voraz, devorei aquelas gostosuras, e quando senti a pressão aumentar, não hesitei em soltar um volumoso arroto, que fez tremer a laje e quase cair as paredes. Um momento constrangedor preencheu a mesa e todos olharam como se eu tivesse acabado de cometer um crime. Senti Raissuele corar, mas nada demais, enchi a terceira pratada com bastante maionese e entornei geral.

Depois veio a sobremesa, banana frita com mel e uma tigela de salada de frutas, além de docinhos caramelados (aqueles de geladeira). Pastor Clodoaldo, o senhor sabe que de vez em quando os olhos são maiores que a boca, e a pressão interna voltou a aumentar. Rezei a Nosso Senhor Jesus Cristo que não me fizesse arrotar de novo, pois de vergonha já tinha muito, e ele atendeu às minhas preces.

Aliviei a pressão com um sonoro e relaxante peido, que escapou do assento da cadeira como um assobio de águia careca amazônica. O uivo suave que escapou de minhas nádegas preencheu o espaço com uma acústica incrível, de certo um dos melhores peidos da história, provocando-me uma deleitosa sensação de satisfação.

Raissuele não compartilhou de meu prazer, pois saiu chorando da mesa, e tive de aguentar a reação raivosa de seu pai, e também de sua mãe que estava pálida como se fosse desmaiar.

Desde então minha namorada me evita e não me liga, os pais querem me ver longe, e toda a minha vida está arruinada. Tudo porque sou evangélico. Se eu fosse espírita, uma coisinha à toa como essa passaria despercebida.

Só lamento que a tatuagem seja permanente. O senhor conhece alguma Raissu?

Gelson Pimentel